O Neo-realismo do cinema: Uma análise de “Ele Está de Volta” sob o contexto de Comolli

Por Ana Carolina Resende Gomes
e João Victor Vilas Boas Militani

O limite entre a realidade e a ficção divide tenuamente as obras do cinema documentário. No capítulo “Sob o risco do real”, do livro “Ver e Poder”, Comolli (2006) trabalha esta relação do audiovisual com o real ali retratado, tão marcado pelo ponto de vista do produtor do filme. O autor diz querer acreditar na verdade mostrada pela câmera, mas desconfia das insinuações do realizador da obra. “O que é o documentário?” é a pergunta que se destaca no meio do texto.

Partindo desta questão, é possível questionar até onde é possível se produzir uma ficção para que esta retrate a realidade. Usar de atores para arrancar do personagem real suas mais profundas convicções, mesmo que seja baseado na fantasia, pode ser considerado um tipo de documentário. Seria essa a questão a ser levantada sobre o filme “Ele está de volta” (Eristwieder da, Alemanha, 2015). Nesta comédia mista de realidade e ficção, o próprio Hitler acorda – como num passe de mágica – no ano de 2014, no exato lugar onde teria se suicidado 70 anos antes. Ninguém acredita que ele seja o verdadeiro Hitler e o tratam como um comediante, caricato, ressuscitando velhos ideais nazistas como se fossem piadas. O trunfo do longa, no entanto, não é o enredo roteirizado, com atuações e cenários, mas sim os personagens reais com quem Hitler contracena. A partir de seu discurso eugênico e racista, o personagem de Hitler (fictício) consegue arrancar discursos semelhantes dos entrevistados (reais) – mostrando como o preconceito ainda se mantém enraizado na população alemã do século XXI.

Comolli constata que os personagens reais, ao serem filmados, atraem o espectador exatamente pelo fato de serem reais – por existirem mesmo fora da tela do cinema, por não fazerem parte do projeto original do filme, mas por compô-lo de forma imponderável ao longo de sua produção. Segundo o autor, é somente depois do uso que se dá a este personagem gravado, favorável ou não aos seus depoimentos – ou seja, somente após a edição das imagens – é que eles se tornarão “seres do cinema”. E conclui dizendo que, para o produtor, não é possível “avacalhar” com a mise-en-scène do que é real – não-ensaiado (COMOLLI, 2006, p.175).

No entanto, como deve ser tratado um filme como “Ele está de volta”? O personagem real é inserido na ficção e, portanto, torna-se parte dela, ao mesmo tempo em que suas declarações são reais. A ficção foi roteirizada e concebida antes do que viria a ser a participação espontânea do entrevistado real e este, portanto, deve ser considerado fictício, por ter sua participação “modelada” pelo projeto do filme?

“O cinema nasceu documentário e dele extraiu seus primeiros poderes” (COMOLLI, 2006, p.174). Esta afirmação do próprio Comolli retrata este misto de identidade do audiovisual. Foi a partir da retratação do real, realizada nas primeiras imagens gravadas pelos irmãos Lumière, que se deu início à toda a mágica do cinema. Em poucos anos, os Lumière (1862-1948) cederiam espaço a Meliés (1861-1938), que transformaria a realidade em fantasia. Pouco mais tarde, Flatherty (1884-1951) editaria a realidade de Nanook (Nanookofthe North, EUA, 1922) e daria pinceladas de ficção na vida real do esquimó. Era o embrião do que viria a ser o neo-realismo citado por Comolli.

Ainda neste contexto, Comolli disserta sobre a própria relação entre documentário e ficção. Este momento de neo-realismo (nouvelle vague) ele enfatiza que essa renovação das técnicas de encenação foi estimulada pela área do fotojornalismo, reportagem de guerra, cine-jornal e até mesmo com o cinema amador. “Hoje, a retomada das roteirizações ficcionais – esgotadas pela estandardização da telenovela – se dá mais uma vez a partir da experiência do documentário” (COMOLLI, 2006, p.170). Neste contexto, no filme podemos averiguar trechos da ficção que se misturam à realidade retratada, já que toda a trajetória do protagonista segue pelo roteiro, do despertar de Hitler, passando pelo momento em que ele conhece um cinegrafista em busca do sucesso, até deslanchar sua carreira e aproveitar da fama para reerguer os ideais nazistas. Para buscar essa verdade, no entanto, o longa não conta com personagens ensaiados, mas coloca Hitler nas ruas, conversando com pessoas reais, arrancando dessas, através de sua atuação impecável, a verdade racista que ainda permeia e Alemanha atual.

O ditador ascende à pop star do momento, ganha um programa de TV e realiza declarações polêmicas sobre as minorias, a religião e até mesmo o governo representado por uma mulher (Angela Merkel), em cenas ensaiadas que rendem aplausos e ovações do público real.

Partindo desta relação, o autor também caracteriza uma sensação de crer e duvidar da realidade apresentada pelo cinema. Entretanto, Comolli ainda garante que esse fator mantém o interesse do telespectador . “Meu prazer, minha curiosidade, minha necessidade de conhecer, meu desejo de saber são recolocados em movimento por essa dialética da crença e da dúvida” (COMOLLI, 2006, p. 171).

No filme, esse momento é bem nítido para o telespectador, já que só depois de um tempo é que se percebe a presença da realidade inserida na ficção. E é a partir disso que se começa a duvidar das próximas cenas. Não sabemos qual o limite da interpretação do ator e nem da verdade por trás das respostas dos entrevistados nas ruas. Esta limitação pode estar, por fim, muito interligada ao que o telespectador quer acreditar que seja real ou não, de acordo com suas próprias crenças e convicções.

“Ele está de volta” é apenas um exemplo dessa visão do espectador, guiada pelo roteiro, mas sustentada por ele próprio. Outros filmes usam da mesma técnica para confundir quem os assiste, embrulhando num mesmo pacote a realidade e a ficção. São os casos da comédia anglo-americana “Borat!” (2006) ou o brasileiro “Mercado de Notícias” (2014), que fundem fatos com encenações e confundem o real com a ficção.

COMOLLI, Jean-Louis. Sob o risco do real. Ver e Poder – A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário.Editora UFMG, Belo Horizonte, 2006.

A Saga do Anel?

Não, não. A Saga da Aliança!

E foi realmente uma saga fazer esse trabalho! O pedido do professor era para que fizéssemos uma fotonovela de 12 fotos baseada no conto “A Aliança” de Luis Fernando Veríssimo. E o que parecia ser bem divertido, se mostrou muito cansativo! A começar pela adaptação e storyboard, passando pela escolha de um bom cenário, com boa iluminação e com bons ângulos de câmera, até, finalmente, a diagramação.

De início, adaptamos a história para ser contada em um restaurante, afinal era uma locação mais fácil. Conseguimos permissão de um rodízio aqui perto e fizemos a primeira sessão de fotos. Mas só com as fotos nas mãos é que vimos que o figurino não estava legal. Sem contar que algumas saíram escuras (até mesmo pra consertar no Photoshop). Ótimo, o próximo passo era apenas… recomeçar!

Fomos para o shopping ABC Plaza, em Santo André: ruído demais. O excesso de cores mataria as fotos.

Então a um café dentro do Extra, ali do lado: proíbido fotografar.

Um teatro abandonado lá na P… que Pariu: paredes horríveis, péssimo pra compor cenário, iluminação muito precária.

Estávamos mortos de cansaço e fome, depois de andar das 10h às 15h sem almoço. O jeito era modificar a adaptação e tentar algo mais fiel, tirar o restaurante e voltar pra sala de uma casa. Mas qual casa? Nossas salas são horríveis, desbotadas e mal iluminadas.

Ah, mas o papai aqui conseguiu, de última hora, faltando apenas 4 dias para entregar o trabalho, a sala da vizinha, aconchegante, com cores mais acolhedoras e um janelão de frente para o sol da manhã! E vamos nós às pressas pra lá, passar uma manhã inteira e fazer uma nova sessão de fotos!

E finalmente, depois de 5 locações e uma tentativa frustrada, conseguimos realizar um ótimo trabalho! A diagramação foi algo a parte, que consumiu mais um dia e meio de trabalho. O resultado tá aí do lado, só clicar pra ampliar a imagem.

Ah, claro, não posso deixar de dizer que fomos aprovados com honras, entre os melhores trabalhos da sala, com elogios inflamados dos dois professores mais exigentes que temos e, também, de dar os créditos ao pessoal e:

Paulo fez a adaptação, a atuação e a diagramação;
Greice fez a atuação;
Eu fiz as fotos e a diagramação;
Moisés cuidou da iluminação; e
Barbara… deu um ótimo apoio moral!

Enfim, dêem-nos os parabéns!