No começo da década, a moda dos engajados era falar mal do movimento EMO, que começava a se destacar no Brasil, em meados de 2003. Naquela época, já distante do punk dos anos 1970 e 80, o visual da nova tribo urbana chocou o país e foi assunto na TV e nas revistas durante um bom tempo. As roupas escuras e a maquiagem carregada já eram comuns de serem vistas entre os góticos, mas a franja extremamente lisa e, principalmente, as supostas tendências homossexuais fizeram do movimento motivo de chacota. Mas vá lá, eles tinham seu ideal, mesmo que superficialmente herdado da cultura punk. E a música também não era das piores. Pareciam, e isso pode soar estranho, o último suspiro da rebeldia adolescente.
Pois bem, a década de 2000 se estendeu e chegou ao fim, os EMOs foram quase esquecidos, a comodidade tomou conta da nova geração e, agora, tudo o que se vê é um movimento vazio, sem ideais, onde o legal é ser bonitinho, bem arrumado e… só. Já não se usam mais jeans rasgados, nem roupas escuras ou acessórios de metal. Agora o bonito é usar roupas coloridas, em tons ofuscantes, que quase chegam a brilhar no escuro; óculos gigantes e cabelos extremamente lisos, penteados em mechas coladas à face (talvez um resquício da franja dos EMOs). Até aí tudo bem, afinal a moda é viva e está em constante movimento – na época dos Beatles, ser rebelde era usar aquele cabelinho de cuia. O problema verdadeiro está no que pensam estes jovens. Eles são rebeldes? Se sim, contra o que levantam sua rebeldia? Porque não se vê movimento algum exigindo que algo mude, cresça ou evolua. Não se vê nenhum jovem lutando por seus ideais, não se vê nenhum adolescente exigindo um governo melhor, mais igualdade, mais amor, fraternidade, paz, liberdade… O que se vê é apenas um rebanho colorido que ouve o que é imposto pela mídia, sem questionar ou procurar meios de fuga – o que é extremamente assustador, afinal, em tempos de internet livre, qualquer um tem acesso a qualquer coisa, e há muita coisa boa na internet que não ganha espaço por falta de público.
Talvez a geração mais velha esteja ficando um pouco quadrada, antiquada. Isso é o que se ouve de algumas pessoas, como justificativa à rabugice dos mais velhos diante do novo. Talvez seja mesmo verdade. Afinal, música ruim, bandas e cantores ruins sempre existiram. Basta ver o início da década de 1990, quando o pagode e o axé tomaram conta do país e vingaram por muitos anos. Ou os meados da década de 1980, quando o brega prevalecia nas rádios. Se voltarmos um pouco mais no tempo, teremos ainda o embate entre os “engajados” e os “alienados”, a MPB e o “Ieieiê”. Jovem Guarda, convenhamos, eram os Restarts daquela época. O público ia ao delírio ao ver aquelas imitações mal feitas dos astros estrangeiros. No entanto existia a alternativa que vinha dos Festivais de Música, com Chico, Gil e Caetano; ou dos palcos do rock que ganhavam seu espaço na década de 1980, com Raul, Legião, Engenheiros, Paralamas etc. Até mesmo quem subia no palco pra fazer graça e falar besteira, tinha lá seu quê de genialidade. Basta ver os Mamonas, que misturaram baião nordestino com heavy metal, como na música “Jumento Selestino” por exemplo, que tem um arranjo fantástico, onde guitarra, bateria, triângulo e zabumba se fundem de maneira incrível! E além do mais, eles não queriam fazer bonito pra ninguém. A intenção deles era troçar mesmo! E agora percebam a decadência: há algum tempo existiam “legionários” e “malucos beleza”. Hoje existe a “família Restart”.
Hoje ainda temos todos esses antigos astros que foram citados. Até Roberto Carlos abandonou o Ieieiê e se tornou o rei da música brasileira e não se deve tirar dele esse mérito, afinal ele soube crescer. No entanto todos esses já são velhos, já “escreveram e já fizeram a sua história”, como já disse Julinho Marassi em sua música mais famosa. Ainda estão aí, mas pertencem a outro tempo. Seus legados ainda são grande influência, porém para alguns poucos seguidores fiéis. O grande público ignora seus feitos ou repudia suas revoluções propostas a cada canção que cantavam – talvez nem mesmo seja capaz de interpretar uma letra de Humberto Gessinger ou Renato Russo.
Antigamente, como bem ficou provado acima, existiam coisas boas e ruins. O que era ruim se perdeu, mas o bom continua vivo ainda hoje. O que se pergunta aqui é: o que há de bom hoje em dia que não seja resto ou reflexo do passado musical recente do país? Temos Restart, Cine, Fiuk, Luan Santana… E qual é a alternativa? O sertanejo, que não foi citado nesse compêndio, ainda se salva com Victor & Léo. Mas e o rock? Quem se contrapõe a esses coloridos? NXZero? E a MPB? Maria Gadú?
A atual geração estagnou-se em um mundinho supostamente perfeito, de uma classe média inerte e classes pobres trazidas no cabresto do assistencialismo. É mais legal fazer parte da massa do que ser o diferente que luta por seus ideais.
A verdade é que precisamos de uma nova crise. Uma nova revolução. O mar calmo não desperta atração, é apenas uma lagoa gigante. São as ondas que o deixam belo! Foi a repressão da ditadura que gerou os grandes do passado. Será que precisamos de uma nova ditadura ou de um péssimo governo para despertar os gigantes do nosso tempo também?
Há tempos não entrava por aqui admito… mas fico feliz que tenha me enviado o link.
Conversei sobre isso ontem mesmo com minha mãe.. estavamos vendo uma reprise de uma entrevista da Gabi com o Restart. Tenho que dizer que aquela mulher faz qualquer coisa parecer bom, por pior que seja. Os meninos até parecem que tem uma cabecinha legal… mas isso diante do que o sucesso faz com eles obviamente.
Mas no quesito “Por que” disso tudo são totalmente falhos… não têm atitudes, não têm motivos, não têm dentro deles a paixão e a força que cantores tinham em outros tempos.
Até aqueles que não fazem composições e são apenas intérpretes, como Ney Matogrosso consegue passar em suas canções mais emoção, vibração e vida quando canta…
Parece que a geração errada de hoje veio para atrair menininhas gritando seus nomes, escandalizando e seguindo seus passos… se rebelando literalmente sem causa quando repreendidos.
Sinceramente acho que falta a paixão do Chico, o atrevimento do Renato, a loucura de um Oswaldo na geração atual… A mídia cria estrelas e não pensadores musicais e intérpretes dignos, e isso pra quem aprecia música, e quem gosta do que ela deveria passar, é bem complicado.
Acredito que teu post, assim como meu comentário serão alvos de muitas negativações de fãs, mas definitivamente essa era musical é tão insosa que quase enoja!
Amei o post, orc!
=**
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Que belo post, meu amigo! A música deixou, há muito, na maioria dos casos, de expressar a atitude de jovens e adolescentes descontentes com aquilo que acontecia.
Hoje percebemos que vivemos em um mundo despolitizado, e nosso país caminha cada vez mais ao buraco porque as velhas raposas continuam no poder enquanto os jovens pouco se interessam pela política e movimentos sociais, atraídos, especialmente, por vertentes vazias de ideologias como Cine e Restart.
Mas acho que ainda há alguns que se salvam. É complicado, por motivos óbvios eu defender, mas na música pop, que é o que eu ouço, existe muito dessa coisa de se lutar pela igualdade, especialmente no que se refere aos direitos LGBT. E não se pode esquecer que Ana Carolina e até a citada Maria Gadu são exemplos de feminismo, por mais que não sejam tão feministas assim.
Wanessa é embaixatriz da ONG SOS Mata Atlântica, e empresta seu nome para defender questões ambientais no Brasil, lutar por políticas públicas que se relacionem com esse tema e desenvolve uma ação de monitoramento do trecho poluído do Tietê.
Ou seja. Mesmo no extremamente comercial, ainda há esperança para esse nosso mundo musical vazio de lutas e objetivos. O que nos entristece é saber que, ao contrário de antigamente, os “lutadores” são minoria.
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Orc, você só acha ruim porque não tem um óculos colorido que se preze.
#prontofalei
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Falando sério agora.
Você mesmo disse no seu post que música ruim sempre existiu. E nem só música considerada ruim, mas música ruim mesmo, sem conteúdo, sem propósito, nada eque, inclusive, não são a representação de nenhum povo ou cultura. Por exemplo, Calypso é o lixo, mas é a síntese de uma cultura do norte do país que não diz nada pra você, mas diz muita coisa para milhares de pessoas, portanto, não pode ser simplesmente jogado no lixo e descartado como sem valia.
Agora, Restar é Menudos. É Backstreet Boys e por aí vai. São bandas/grupos/cantores resultantes única e exclusivamente da ação de produtores bons. São produtos pop desenhados pra serem cd’s, shows, camisetas, revistas, álbuns, pôsteres, etc. São desenhados para agradar à meninos de cabeça fraca e mêninas naquele limbo entre a infância e a puberdade.
E isso nunca vai morrer, porque são essas merdas que geram muita grana.
Agora, falar que no passado existia alternativa e hoje não tem mais é puro saudosismo barato.
Alternativa sempre tem, aos montes. Eu me arrisco a dizer que hoje tem mais coisa boa do que antes, mas você tem que ir atrás, tem que correr e procurar e se esforçar, porque o que a gente tem agora é um mar de coisas, uma mar de movimentos, um mar de artistas, um mar de manifestações culturais. Porque os meios foram democratizados e o pensamento também foi democratizado.
Era melhor no passado também não é coisa de hoje em dia.
Saca essa letra aqui:
___________________________
Como Nossos Pais
Elis Regina
Composição : Belchior
Não quero lhe falar,
Meu grande amor,
Das coisas que aprendi
Nos discos…
Quero lhe contar como eu vivi
E tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
Eu sei que o amor
É uma coisa boa
Mas também sei
Que qualquer canto
É menor do que a vida
De qualquer pessoa…
Por isso cuidado meu bem
Há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal
Está fechado prá nós
Que somos jovens…
Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço,
O seu lábio e a sua voz…
Você me pergunta
Pela minha paixão
Digo que estou encantada
Como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade
Não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento
Cheiro de nova estação
Eu sei de tudo na ferida viva
Do meu coração…
Já faz tempo
Eu vi você na rua
Cabelo ao vento
Gente jovem reunida
Na parede da memória
Essa lembrança
É o quadro que dói mais…
Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Ainda somos os mesmos
E vivemos
Como os nossos pais…
Nossos ídolos
Ainda são os mesmos
E as aparências
Não enganam não
Você diz que depois deles
Não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer
Que eu tô por fora
Ou então
Que eu tô inventando…
Mas é você
Que ama o passado
E que não vê
É você
Que ama o passado
E que não vê
Que o novo sempre vem…
Hoje eu sei
Que quem me deu a idéia
De uma nova consciência
E juventude
Tá em casa
Guardado por Deus
Contando vil metal…
Minha dor é perceber
Que apesar de termos
Feito tudo, tudo,
Tudo o que fizemos
Nós ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Ainda somos
Os mesmos e vivemos
Como os nossos pais…
_________________
Essa é uma das músicas que a superexposição matou, mas presta atenção no que ela fala. Os ídolos ainda são os mesmos, o sinal está fechado pra nós, DEPOIS DELES NÃO APARECEU MAIS NINGUÉM. Aparece. E continua aparecendo.
A vida continua linda, Snaga.
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Olá Snaga, tudo bom!
Passei pra retribuir a visita que vc fez ao meu Blog Jeito Lunático. :) :)
Muito linda sua postagem de “Indios”.
Apareça sempre!
Seu Blog é muito bom! *)
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Bom, vou deixar o meu comentário!
Pessoas que gostam de artistas do passado, por acharem que eles eram melhores, mais engajados na arte e na política. Com certeza eles eram, era um outro momento histórico, aquele momento propiciava que tivesse artistas que desafiassem a política naquele momento. As pessoas lutaram, provocaram e fizeram as manifestações necessárias.
Hoje ainda temos pelo o que reivindicar, mas os nossos propósitos de alguma forma falharam, caíram por terra. Assim como diz uma música do Cazuza, meus ídolos morreram de overdose e os meus inimigos estão no poder. Perdemos a fé, naquilo que talvez nunca conseguiremos alcançar, uma verdadeira revolução de sentidos e ideais, de política e arte, cultural principalmente. E o que vemos agora é uma geração acomodada, e que deixa isso assim que está tudo bem. Uma geração que briga pelas coisas erradas, que faz manifestos em prol de coisas equivocadas.
Penso, que com a internet que nos dá milhões de possibilidades, como músicas, filmes, notícias, livros, política e uma infinidade de coisas, porque tantas pessoas aceitam engolir aquilo que a mídia manda. E com tantas formas de protestos, porque ainda permanecemos absolvendo e digerindo tudo com tamanha tranquilidade? Acho que talvez aquele pesadelo, tão bem descrito no 1984, talvez tenha se tornado realidade, e nós ainda não percebemos.
Pronto! Deixei o comentário! rsrsrs
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Faz tanto que tempo que eu não comento no seu blog, saudade disso!
Enfiim, concordo em partes com o que vc disse. O estilo de músicas dos “coloridos” é sem conteúdo, é modinha e é pra ganhar dinheiro. São bandas muito parecidas e falam dos mesmos temas românticos de sempre. Mas vc tem que pensar que são músicos adolescentes que fazem música pra adolescentes de 11 a 15, no máximo. O público dessas bandas e as proprias bandas ainda têm muito que amadurecer musicalmente. No texto, vc comparou com os hippies, mas o movimento hippie era composto principalmente de universitários e de bandas muito mais adultas. Você também compara com os Emos, mas eles são um grupo fechado que nunca chegou a ser moda. Eles chocaram na época porque as idéias eram muito radicais, mas eles são como os punks. Esse tipo de tribo fechada com ideologia fixa e radical nunca chega a ser moda.
No texto, vc compara esse movimento com outros do passado, mas isso não pode ser feito. As modas e as músicas estão atreladas ao seu tempo e à mentalidade da sociedade da época. Você acha que as bandas que falavam de política, movimento social e estudantil fariam sucesso hoje? As pessoas buscam na música o que elas estão vivendo no momento. E se o país vive em um estado de comodidade política, digamos assim, as bandas que falam desses temas não fazem sucesso e não crescem.
Não devemos abraçar o movimento dos “coloridos” como as adolescentes fazem, mas negar totalmente o que é novo é ceticismo. Eu acho que alguns dessas bandas ainda podem crescer amadurecer, sair da “mesmice” e se tornarem boas e com músicos habilidosos. Afinal de contas, muitas bandas excelentes que temos hoje em dias começaram como modinha e mudaram. E dentre essas ou posso citar a minha preferida, Metallica e até o Roberto Carlos que você citou. Eles não são perdidos, mas tem um longo caminho a ser percorrido pra se tornarem bons.
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Que bom que ainda temos pessoas dispostas a debater, discordar e tentar tirar nosso mundinho (gigante) desse longo estado cataléptico, precisamos nos juntar pois somos muitos, apenas estamos desorganizados, ou ocupados demais para levantar qualquer bandeira, simbora minha gente por mais que a frase seja antiga, espera ainda não é fazer.
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Por incrível que pareça, 2 anos depois desse seu texto triste, posso trazer uma boa notícia ao menos.
O Gigante Acordou.
Aqui em Vitória – ES, as pessoas atravessaram uma ponte de 3,3 km pedindo por um país melhor cantando músicas do Legião Urbana e Barão Vermelho. Foi maravilhoso estar lá e saber que ainda existem pessoas conscientes e outras que acordaram.
Infelizmente a maioria ainda está como em seu texto: Alienadas achando que tudo é carnaval;
Ainda assim é bom saber que muitos ainda são os que sonham com um mundo melhor.
E é por esses que eu ainda tenho esperança de que a boa música volte a prevalecer, e que futuramente nas próximas manifestações, as pessoas não cantem apenas musicas escritas por Renato Russo e Cazuza, mas também por pessoas que vivem este tempo e lutam ao lado deles.
E é por isso que eu não irei desistir de escrever as minhas músicas e contar tudo o que temos vivido. Esse tipo de coisa deve ficar registrado, não só em fitas ou em livros didádicos esquecidos nas prateleiras, mas também nas melodias que devem entrar nas mentes e jamais ser esquecidas por aqueles que as ouvir.
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